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Enquanto mães reais esperam por vaga, Rosângela Moro pensa nas “mães de reborn”

Do Paçoca com Cebola: “A deputada federal Rosangela Moro (União-SP) apresentou um projeto de lei que propõe atendimento psicológico gratuito, via Sistema Único de Saúde (SUS), a pessoas em sofrimento mental associado ao vínculo afetivo com bonecas hiper-realistas, os chamados “bebês reborn”. Segundo o texto da proposta, o atendimento deve ocorrer com respeito à “diversidade afetiva e da não discriminação, sendo vedado o tratamento estigmatizante, vexatório ou coercitivo”.

À primeira vista, a proposta parece se apoiar em um discurso inclusivo e sensível às diferentes expressões do afeto humano. Mas uma análise mais cuidadosa revela uma desconexão grave com as prioridades da saúde mental no Brasil.

A realidade do SUS e da saúde mental

De acordo com o Ministério da Saúde, o Brasil conta com cerca de 2.800 Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) espalhados pelo território nacional, responsáveis por acolher pessoas com transtornos mentais severos e persistentes. No entanto, a estrutura é insuficiente diante da crescente demanda. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que o Brasil é o país com a maior taxa de pessoas ansiosas no mundo e o quinto com maior número de casos de depressão.

Enquanto isso, pacientes em sofrimento mental aguardam meses para conseguir uma primeira consulta com psicólogo ou psiquiatra pelo SUS. O atendimento ambulatorial é sobrecarregado, e faltam profissionais especializados em saúde mental em regiões mais pobres e remotas do país. Segundo o próprio Ministério da Saúde, quase 60% dos municípios brasileiros não têm nenhum psicólogo atuando na atenção básica.

Diante desse cenário, é legítimo questionar: por que priorizar um atendimento psicológico público para pessoas que têm condições de investir até R$ 10 mil em uma boneca hiper-realista?

O recorte elitista da proposta

O preço médio de uma boneca reborn varia entre R$ 300 e R$ 1.500 para modelos intermediários, podendo ultrapassar os R$ 9.500 nas versões mais sofisticadas, feitas em silicone sólido e com acessórios exclusivos. Esses valores estão completamente fora da realidade da maior parte dos brasileiros. Isso evidencia o viés elitista de uma proposta que destina recursos públicos a um nicho específico e economicamente privilegiado.

Não se trata de deslegitimar o sofrimento psicológico de qualquer indivíduo — inclusive daqueles que encontram alívio afetivo em objetos simbólicos. O problema está na priorização. Em um país onde pessoas em situação de rua, vítimas de violência, dependentes químicos e adolescentes em sofrimento grave não têm acesso mínimo a tratamento, oferecer atendimento prioritário a quem pode pagar por artigos de luxo soa no mínimo irresponsável.

Por Gilmar Ferreira/Diário de Maringá

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