
Senado italiano aprova decreto que restringe direito por descendência de ítalo-brasileiros
“Não se trata apenas de ter mais um documento europeu. É uma questão de pertencimento e legado familiar.”
A ex-parlamentar italiana, Renata Bueno, mostra em artigo que publicamos a seguir, os desfechos da nova lei italiana que impacta na cidadania ítalo-brasileira.
O Senado italiano aprovou nesta quinta-feira (15), por 81 votos a favor e 37 contra, o Decreto-Lei nº 36/2025, que altera de forma significativa as regras para o reconhecimento da cidadania italiana por descendência (ius sanguinis). Assinado pelo ministro das Relações Exteriores, Antonio Tajani, o texto segue agora para votação na Câmara dos Deputados, com prazo até 27 de maio para sua conversão definitiva em lei.
A medida, que afeta diretamente milhões de descendentes de italianos — especialmente os cerca de 30 milhões de ítalo-brasileiros — tem gerado grande controvérsia, tanto pelo conteúdo quanto pela rapidez de sua aprovação.
Principais mudanças
O decreto altera a Lei nº 91/1992 ao incluir o novo artigo 3-bis, promovendo mudanças substanciais:
Limitação geracional: Apenas filhos e netos de italianos nascidos no exterior terão direito à cidadania automática.
Vínculo territorial: Filhos de italianos nascidos fora da Itália só terão direito automático se ao menos um dos pais tiver residido legalmente no país por dois anos consecutivos antes do nascimento.
Centralização e aumento de taxas: A partir de 2026, os pedidos passarão a ser processados diretamente pelo Ministério das Relações Exteriores. A taxa será reajustada de €600 para €700.
Prazos e suspensão de novos processos: Pedidos protocolados até as 23h59 (horário de Roma) do dia 27 de março de 2025 seguirão sob as regras atuais. Novas solicitações estão temporariamente suspensas.
Durante o debate no Senado, foram apresentadas 106 emendas — a maioria rejeitada. O governo chegou a ameaçar recorrer ao voto de confiança (voto di fiducia), o que reduziria as possibilidades de alteração no texto.
Impacto entre os ítalo-brasileiros
A comunidade ítalo-brasileira será uma das mais afetadas pelas novas regras. Grande parte dos brasileiros descendem de imigrantes italianos que chegaram ao país entre os séculos XIX e XX — o que, com a nova limitação geracional, inviabiliza o reconhecimento da cidadania para muitos. Além disso, a naturalização de muitos antepassados como cidadãos brasileiros poderá impedir seus descendentes diretos de obter a cidadania italiana.
Para diversos ítalo-descendentes no Brasil, o reconhecimento da cidadania representa muito mais do que um passaporte europeu. É, sobretudo, um resgate de identidade e pertencimento familiar. A associação Nacionalitália resumiu o sentimento de muitos ao afirmar: “Não se trata apenas de ter mais um documento europeu. É uma questão de pertencimento e legado familiar.”
Próximos passos
O futuro do decreto agora depende da Câmara dos Deputados italiana, que tem até o dia 27 de maio para aprovar ou rejeitar o texto. Caso não seja convertido em lei dentro desse prazo, o Decreto-Lei nº 36/2025 perderá sua validade.
Mesmo com a possibilidade de aprovação, já há articulações jurídicas e políticas em curso para contestar o decreto judicialmente, tanto na Itália quanto em tribunais internacionais.
Enquanto isso, organizações de apoio a descendentes de italianos, advogados especializados em cidadania e lideranças políticas ligadas à comunidade ítalo-brasileira seguem mobilizadas. A expectativa é de que a pressão internacional possa ser decisiva para o futuro do ius sanguinis. Para esses grupos, a luta pelo reconhecimento da cidadania italiana por descendência está longe de terminar.