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Trump quer fazer do Brasil o quintal de sua casa

O presidente norte-americano, Donald Trump, tem, como marca registrada, a retaliação, o unilateralismo e uma visão de mundo onde aliados são subordinados e adversários, inimigos declarados. Assim, diante de suas bizarras ações de prepotência, o Brasil muitas vezes é tratado como um quintal da casa americana.

Ele, um extremista, impôs tarifas sobre o aço e o alumínio brasileiros sob o pretexto da “segurança nacional”, um argumento tão frágil quanto autoritário. Usou, também, Jair Bolsonaro, que alinhou-se ideologicamente a Trump com entusiasmo e deixa claro que, para ele, amizade internacional é uma via de mão única: os outros cedem, ele manda.

Sua decisão em aplicar uma tarifa de 50% sobre o Brasil “não tem nenhuma base econômica”. Quem sustenta é o ex-diretor do BC (Banco Central) para Assuntos Internacionais, Alexandre Schwartsman.

Em carta publicada nesta quarta-feira (9) na rede Truth Social, e endereçada ao presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Trump anunciou que a nova tarifa, que entrará em vigor no dia 1º de agosto, se deve, em parte, à postura do STF (Supremo Tribunal Federal) com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Houve, no país, uma reação em cadeia. Brasil, com sua economia robusta, seu peso diplomático e sua diversidade de relações comerciais, não pode se deixar reduzir a um vassalo de Washington.

Essa lógica de imposição e ameaça faz parte de um projeto maior de dominação econômica e simbólica. Trump não vê o Brasil como parceiro estratégico, mas como uma peça descartável no tabuleiro de sua política populista e protecionista. Quando interessa, elogia. Quando o Brasil dá sinais de autonomia ou se aproxima de outros blocos — como os BRICS ou a União Europeia —, a resposta é dura, quase sempre em forma de sanção ou ameaça comercial.

O trumpismo resgata a mentalidade da Guerra Fria, onde a América Latina era zona de influência incontestável dos Estados Unidos. É esse o papel que Trump tenta reimpor ao Brasil: o de país satélite, sem voz própria, sempre de prontidão para obedecer a ordens vindas do Norte.

Porque Trump pode mudar de discurso conforme o vento, mas seu instinto de dominação não muda. E o Brasil não é quintal — é nação.

Repercussão no Brasil

(Por Emerson Cervi, jornalista, escritor e professor de ciências políticas): “Vou copiar aqui tradução de postagem de ontem do economista Paul Krugman, professor da Universidade de Princeton e prêmio Nobel de economia em 2008.

Nem precisava ter ganho um Nobel por contribuições na área de comércio internacional para saber que o que Trump faz é embaralhar o comércio para prejudicar a democracia.

E olha que Krugman não tem o desprazer de ter amigos bolsonaristas no convívio diário, viu.

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Emerson Urizzi Cervi. Foto: divulgação/UFPR

Ditadura de Trump, usando tarifas para combater a democracia

Paul Krugman

Normalmente não faço postagens à noite. Uma por dia no café da manhã é, na minha opinião, suficiente — ou mais que suficiente. Mas a última carta de Trump, impondo uma tarifa de 50% sobre o Brasil, representa uma nova guinada e, por isso, merece um boletim especial. Afinal, é algo ao mesmo tempo perverso e megalomaníaco.

Perceba que Trump mal tenta fingir que há uma justificativa econômica para essa ação. Trata-se unicamente de punir o Brasil por colocar Jair Bolsonaro em julgamento.

Bolsonaro, como a maioria dos leitores provavelmente sabe, é o ex-presidente do Brasil, que perdeu a última eleição — mas tentou se manter no poder por meio de um golpe para reverter o resultado. Claro que isso soa familiar.

Agora, esta não seria a primeira vez que os EUA usam a política tarifária com um objetivo político. Muito pelo contrário: o sistema de comércio internacional que estabelecemos após a Segunda Guerra Mundial foi, em parte, motivado pela crença dos líderes americanos de que o comércio, além de economicamente benéfico, seria uma força pela paz e ajudaria a fortalecer a democracia ao redor do mundo. Provavelmente estavam certos, e de qualquer forma era um objetivo nobre.

Agora, Trump está tentando usar tarifas para ajudar outro aspirante a ditador. Se você ainda achava que os EUA eram um dos “mocinhos” do mundo, isso deveria deixar claro de que lado estamos hoje em dia.

Por que digo que é megalomaníaco? O Brasil tem mais de 200 milhões de habitantes. Veja para onde vão suas exportações:

Essas exportações para os EUA representam menos de 2% do PIB do Brasil. Trump realmente imagina que pode usar tarifas para intimidar uma nação enorme — que nem sequer depende muito do mercado americano — a abandonar a democracia?

Como eu disse, perverso e megalomaníaco. Se ainda tivéssemos uma democracia funcional, essa jogada em relação ao Brasil já seria, por si só, motivo suficiente para um processo de impeachment. Claro, teria que entrar na fila atrás de todos os outros motivos.

De qualquer forma, não ignore isso. Estamos diante de mais um passo terrível na espiral descendente do nosso país.

Foto: Divulgação/Leigh Bureau

O Correio Deselegante de Trump e a Catarse Masoquista dos Patriotários

Paulino Motter

A carta pública do ex-presidente Donald Trump ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, divulgada nesta quarta-feira (09/7), inaugura um capítulo de grave tensão diplomática entre Brasil e Estados Unidos, sem precedentes na história recente. Num gesto de afronta aberta à soberania nacional e de violação às normas elementares do Direito Internacional, Trump não apenas interferiu em assuntos internos brasileiros — ao opinar de maneira agressiva e inaceitável sobre o julgamento de Jair Bolsonaro — como ainda declarou abertamente uma guerra comercial, ao anunciar tarifas punitivas de 50% sobre todos os produtos brasileiros destinados ao mercado norte-americano.

A gravidade do episódio se amplia quando se considera que Jair Bolsonaro, a quem Trump faz elogios na missiva, é réu no Supremo Tribunal Federal por liderar uma conspiração golpista destinada a impedir a posse do presidente democraticamente eleito em 2022, com apoio de ministros, militares e empresários extremistas. Um político notório por defender ditaduras, a tortura e o assassinato de adversários do regime militar brasileiro. Ao tentar intimidar o Supremo Tribunal Federal e atacar o sistema judiciário brasileiro, Trump repete aqui o roteiro que vem impondo à Suprema Corte dos EUA, que já vem se curvando, em várias ocasiões, à sua agenda autoritária.

É igualmente importante recordar que Brasil e Estados Unidos mantêm relações diplomáticas e comerciais sólidas há mais de dois séculos. Os dois países são parceiros estratégicos em diversos setores e, ao contrário do que Trump alega, o saldo da balança comercial hoje é favorável aos norte-americanos. Em 2024, os EUA foram o segundo maior parceiro comercial do Brasil, com exportações brasileiras superiores a US$ 39 bilhões — número inferior ao das importações brasileiras de produtos norte-americanos, principalmente industrializados de alto valor agregado. Ou seja, Trump mente deliberadamente quando afirma que os EUA acumulam déficits insustentáveis com o Brasil. Seu discurso não passa de chantagem política para uso eleitoral doméstico e de solidariedade ideológica com o bolsonarismo, hoje sitiado pela Justiça brasileira.

A crise instaurada por Trump oferece, paradoxalmente, uma oportunidade histórica para o presidente Lula demonstrar suas credenciais de estadista. Conforme estabelece o artigo 4º da Constituição Federal, a política externa brasileira se pauta pela defesa da independência nacional, autodeterminação dos povos, solução pacífica de controvérsias e repúdio à intervenção. É hora de reafirmar esses princípios com serenidade e firmeza.

O presidente da República deve, com urgência, convocar o Conselho da República, conforme previsto no artigo 89 da Constituição, já que o país se defronta com uma ameaça grave à estabilidade institucional e à sua economia. E mais: é momento de se apresentar como chefe de Estado e reunir, publicamente e com transparência, as lideranças políticas de todas as forças democráticas do país — do centro à esquerda, passando pelas frentes conservadoras legítimas — além de representantes da sociedade civil organizada, do agronegócio, da indústria, do setor acadêmico e cultural, para definir uma resposta de Estado frente à tentativa de intimidação e ingerência estrangeira. A defesa da soberania nacional não é pauta de governo, mas compromisso republicano e constitucional de todas as forças democráticas.

Como reação imediata, o Brasil deve acionar o princípio da reciprocidade, revisar benefícios comerciais concedidos unilateralmente aos EUA e, se necessário, estabelecer tarifas equivalentes sobre produtos norte-americanos. Ao mesmo tempo, precisa denunciar a ilegalidade da medida junto aos organismos internacionais e à opinião pública mundial, expondo a natureza política e autoritária da agressão trumpista.

É indispensável, também, reconhecer que o episódio evidencia de forma inequívoca uma grave lacuna no ordenamento jurídico brasileiro: a ausência de tipificação clara e atualizada para atos de conspiração, traição e colaboração lesiva com governos estrangeiros contra os interesses e a segurança nacional. Em boa hora, o Congresso Nacional deveria abrir, com urgência, o debate para a elaboração de legislação moderna e rigorosa — em parte inspirada, ironicamente, no próprio ordenamento jurídico norte-americano, que pune com severidade qualquer tentativa de cooperação lesiva com governos hostis. A democracia brasileira precisa de instrumentos jurídicos eficazes para proteger-se de seus próprios traidores.

Se o gesto de Trump já seria grave por si só, mais escandalosa ainda foi a aprovação, na tarde de hoje, pela Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, de um requerimento infame — de número 121/2025 — apresentado pelo deputado Sóstenes Cavalcante, líder do partido de Jair Bolsonaro. A proposta aprova uma “moção de louvor e regozijo” a Donald Trump “pelo brilhante trabalho desenvolvido como presidente da maior nação e pela incansável luta em defesa da democracia e da liberdade de expressão em todo o planeta”. Trata-se de uma das maiores infâmias já perpetradas na história recente do Congresso Nacional — uma cena de submissão política e de bajulação vergonhosa a um chefe de Estado estrangeiro que, no mesmo dia, agride institucional e economicamente o Brasil.

Já se conhecia aspectos da malignidade do bolsonarismo, como a total falta de empatia demonstrada durante a mortandade da pandemia da COVID-19. É só se lembrar do famigerado “E daí? Não sou coveiro” e do deboche cruel, com direito a imitação grotesca de pacientes com dificuldades respiratórias. Como alguém que perdeu o pai e um cunhado para a COVID-19, tomei como um insulto pessoal aquelas diatribes canalhas do então presidente — e Trump, ao referir-se a Bolsonaro como um líder respeitado e respeitável, revela-se da mesma laia, do mesmo padrão moral e mental. Agora, diante das declarações públicas de algumas das principais lideranças bolsonaristas no Congresso, revela-se outra faceta igualmente doentia desse movimento: o masoquismo político. Não há outra explicação racional para manifestações públicas de euforia, contentamento e gozo diante da gratuidade e crueldade do assalto econômico e diplomático de Trump ao Brasil. A submissão explícita ao agressor, travestida de deferência ideológica, só reforça o nível de degradação moral e institucional a que esse segmento foi capaz de se submeter.

Essa iniciativa afrontosa envergonha o Parlamento brasileiro, atenta contra a dignidade da nação e reforça a urgência de modernização legal para responsabilizar, civil e criminalmente, representantes eleitos que atuem contra os interesses nacionais, especialmente em articulação ou conivência com governos hostis.

É de se esperar maturidade dos nossos líderes. Tudo o que o Brasil não precisa, neste momento, é alimentar qualquer tipo de nacionalismo retrógrado ou ranço antiamericano. Não se pode confundir a nação com o líder de ocasião. É de se esperar — e torcer — que os Estados Unidos sobrevivam a Trump, assim como a maioria de nós brasileiros deu seu veredito a Bolsonaro nas urnas.

Felizmente, o Brasil conta, hoje, com uma diplomacia profissional, estruturada e respeitada. É tranquilizador ter o experiente embaixador Celso Amorim como assessor especial para assuntos internacionais e o chanceler Mauro Vieira à frente do Ministério das Relações Exteriores. A condução da política externa brasileira não poderia estar em melhores mãos.

Se há algo pedagógico nesse episódio, será a exposição definitiva dos setores que, em nome de um falso patriotismo, se alinham de forma subserviente a interesses estrangeiros, mesmo contra o Brasil. A História haverá de registrar, com todas as letras, quem esteve de que lado. E, que fique claro: a soberania, a legalidade e a democracia brasileiras não são moeda de troca em disputas eleitorais de qualquer outro país.

O momento é grave e exige maturidade, firmeza e lucidez. Ao enfrentar com inteligência e serenidade a provocação de Trump e seus aliados internos, o Brasil poderá reafirmar, perante a comunidade internacional, seu compromisso com a democracia, a legalidade internacional e a dignidade nacional. E ao fazê-lo, não estará defendendo um governo ou uma corrente política — estará defendendo a República.

Que assim seja.

Paulino Motter é jornalista e gestor público, mestre em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB) e doutor em Educação pela Universidade de Wisconsin-Madison (EUA).

professor Paulino Motter
Professor Paulino Motter. Foto: Acervo pessoal

G7 do Paraná abraça o governo brasileiro contra a taxação de Trump

Nota – Taxação de 50% sobre produtos brasileiros pelos EUA
O G7 Paraná — grupo que reúne sete grandes entidades do setor produtivo paranaense (Fecomércio, Faciap, Faep, Fiep, Fetranspar, Ocepar e ACP) — se posiciona junto ao governo brasileiro, solicitando agilidade diante do anúncio da taxação de 50% sobre produtos brasileiros, que deverá ser imposta pelos Estados Unidos a partir de 1º de agosto.

O G7 recomenda que as autoridades federais abram canais de diálogo efetivos com o governo norte-americano, buscando a anulação dessa medida e, assim, evitando prejuízos imensuráveis para a economia nacional.

O grupo também está avaliando, junto a diferentes segmentos do setor produtivo estadual, os possíveis impactos para a economia paranaense — que mantém inúmeros negócios com os Estados Unidos, especialmente nas áreas do agronegócio, indústria, transporte e comércio.

“Esperamos sensatez, agilidade e tato neste decisivo momento de negociação com os americanos, pois o Paraná, em especial, pode vir a perder competitividade com o aumento do valor dos produtos”, destaca o coordenador do G7, coronel Sérgio Malucelli.

coronel sergio malucelli
Coronel Sergio Malucelli. (Foto: Reprodução/Fetranspar)

Posicionamento da Fiep sobre taxação imposta pelos EUA

Diante da perplexidade gerada pelo anúncio da taxação de 50% sobre produtos brasileiros que será imposta pelos Estados Unidos a partir de 1º de agosto, a Federação das Indústrias do Paraná (Fiep) avalia quais serão os possíveis impactos para diferentes segmentos do setor industrial paranaense.

Mais do que isso, a Fiep aguarda o posicionamento do governo brasileiro em relação a essa medida, esperando que sejam abertos canais de diálogo efetivos para se buscar, junto ao governo norte-americano, a anulação dessa taxação, evitando-se assim prejuízos imensuráveis para a economia nacional.

Sobretaxa acende sinal de alerta no agro, diz FAEP

O Sistema FAEP vê com grande preocupação a decisão dos Estados Unidos de sobretaxar produtos brasileiros, especialmente itens agropecuários. Essa medida representa uma ameaça direta à competitividade do nosso agronegócio no mercado internacional e pode causar prejuízos significativos aos produtores paranaenses e de todo o Brasil. É fundamental que o governo federal busque preservar nossos acordos comerciais e minimizar os impactos sobre quem trabalha no campo. O setor produtivo precisa de segurança e previsibilidade para continuar gerando emprego, renda e desenvolvimento.

“A sobretaxa dos Estados Unidos às exportações brasileiras, principalmente de produtos agropecuários, acende um sinal de alerta. Essa medida pode prejudicar nossos produtores e comprometer a presença do Brasil no mercado internacional. É preciso que o governo atue com firmeza para proteger o agro e garantir segurança ao setor”, afirma Ágide Eduardo Meneguette, presidente da FAEP.

Ágide Eduardo Meneguette agro paraná
Foto: Sistema FAEP/SENAR-PR

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